Falar de futebol, conversa da cueca

Desde que chegou, há pouco tempo (dois, três meses?), à Casa Fernando Pessoa Francisco José Viegas imprimiu-lhe uma dinâmica admirável. Desse feito, da visibilidade que rapidamente conferiu à Casa, a minha salva. Tal não significa que adira incondicionalmente a tudo o que por lá se faz e pensa fazer. O programa previsto para o mês de Maio sobre futebol é um bom exemplo disso. Merece-me, com efeito, reparo, reservas. Veja-se o contraste. Há umas semanas, sobre a crítica (e os amigos), havia gente de vários quadrantes, gente da crítica, do ensaio, da Academia. Em Maio, sobre futebol, nas palavras do etnólogo Christian Bromberger, a bagatela mais séria do mundo, a animação resumir-se-á a jornalistas (mais e menos especializados) e a malta que manda umas bocas sobre futebol em blogues. Alguns dos quais descobrimos em quase todas, numa extraordinária exibição de versatilidade dóxica, versatilidade decerto inscrita na massa do sangue. Lá estará, ressai, o omníscio Pedro Mexia.
Nem era preciso ir longe – fora de Lisboa, entenda-se – para desencantar uns contributos menos previsíveis, mais estimulantes, mais capazes de ir além das banalidades e das chalaças do costume, de outra densidade. Assim de repente lembro-me do José Neves – se não me engano, em tempos colaborou com o Blogue de Esquerda; anteontem vi-o no Clube de Jornalistas na RPT2 a falar sobre questões homólogas às que, tudo indica, serão debatidas na última das sessões do ciclo Futebol da Casa –, que coordenou com Nuno Domingos um volume intitulado A Época do Futebol, editado pela Assírio & Alvim, ou da Ana Santos, que estudou em particular o caso Eusébio como ícone da Nação.
Bem sei que o futebol distrai muita gente, é um bom pé-de-cantiga para o entretém e para a sociabilidade de bairro, profissional, masculina. Mas, francamente, é uma opção precipitada, descuidada. Precipitada, descuidada e parecente de socialite (opinialite?), com uns garotos de programa a fazer conversa da cueca, mouca, em circuito de auto-evidência. Não tenho nada contra eles, os garotos (não fosse eu próprio do género ir com todas), e ela, a conversa (é do que mais tenho feito por aqui), mas não havia necessidade de lhes dar caução cultural. Sobretudo havendo alternativa mais capaz.

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