She’s good enough to be a real actress #7


Elizabeth and I in a café in Montparnasse, 1931
André Kertész

[para todas as ricas meninas]

A personagem que ela inventara olhava-se no espelho e no espelho via o lado mortal dos seus defeitos. Sem intervalo de respiração retida dizia: tive de mudar de vida. Comecei por mim. A mim pareceu-me inverosímil que a história da adolescente às vezes com catadura de rapazinho cedo tirado à mãe que trazia um e mais dois ocupados no encalço pudesse solucionar assim, numa meditação filocénica apressada. A personagem, que era insubmissa e altiva mas nunca cínica, não poderia contentar-se da transformação em agnus dei sem definhar em toda a linha. Como uma capitulação sem condições, o resgate feliz. Franzi ostensivamente a testa. Em seguida lembrei-lhe que a fadiga, adiada em pequenos ais de impaciência, leva pouco tempo a invadir o discernimento e que a obra, como o gosto discreto, não isenta critério. Aguardei que me contrapusesse que o método não a abandonara e que estava apenas a transitar sem pressa numa crise de amadurecimento criativo. Fez-se silêncio. Durante uns minutos nada acrescentámos um ao outro – eu porque não queria que pensasse que a cortejava, porém pensando: quem o não tem? É só um pouco de medo de não ter a quem.
Vem cá, ouvi, e só depois achei o silêncio quebrado. Aproximei-me, mais meigo que dócil. Pousou a cabeça no meu ombro e, expirada a confidente, proferiu a ideia da rejeição pura: se fossemos amantes, como quem um dia pensou remover todos os obstáculos, estaríamos agora perto do fim.

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